1. Tenho problemas em adormecer. Naquele lugar intermédio entre sono e insónia, vejo vídeos onde se passeia por Tóquio de madrugada ou se viaja num cockpit de um avião durante a noite. Uma espécie de playthrough num jogo sem objectivo, senão o de ver o cenário.
2. Passei uns meses a conhecer as ruas de uma cidade à distância e, quando lá estive, não era a mesma que vi pelo ecrã. Era uma experiência mediada: estive lá, mas não estava nem lá nem cá. Fez-me pensar nas pessoas que coleccionam países no passaporte como se fosse um jogo. É como se nunca lá tivessem ido. Não se conhece uma cidade até nos perdermos de noite nela e saber para que lado fica o nosso destino, sem ter medo de estar perdidos.
3. Sabes onde estás quando estás ligado ao teu dispositivo? Não te sentes invisível – ou impune – quando és o único que não está a olhar para um ecrã no comboio, no café, na rua? És um espectador participante da narrativa da realidade? Ou és um público de um, com um espetáculo feito à tua medida? Para Guy Debord, o espetáculo é o «oposto do diálogo».
4. As redes são espaços liminares. O conteúdo parece ter valor, mas significa nada, nem que seja pela quantidade. Vale menos que um grão de areia na praia da Figueira. Mas o scroll infinito dá uma sensação de flow, de ligação ao momento pela acção de navegar sem sair do mesmo lugar. «Quanto mais comunicamos, pior as coisas parecem ficar», diz Nicholas Carr, autor de ‘Superbloom: How Technologies of Connection Tear Us Apart’. «Conversations kill», dizia Scott Weiland, em Big Empty.
5. O conteúdo é cada vez mais absurdo. O Absurdo, como ferramenta conceptual, estilística e narrativa na arte tinha uma função provocativa. Agora, é a norma, retirando significado ao que não é absurdo, dando espaço ao que não é real.
6. Onde estamos? «Estou onde não devia estar / Estou no compêndio de história onde a mentira se organiza para proclamar uma 0verdade’» – Alexandre O´Neill.
7. Estamos à cabeceira de uma cama de hospital, à espera que o inevitável aconteça.