Uma das reais vantagens de fazer parte de um mercado de reduzida dimensão é que as polémicas e as discórdias para com um fabricante chegam aos consumidores portugueses com a força das ondas numa praia fluvial na Ribeira de Brunheiros (eu vi o que fizeste aqui) – isto é, sem causar grande perturbação na margem.
Eu já perdi a conta aos momentos de fúria nacional de consumidores contra a Apple, em momentos de verdadeira incompreensão da marca para com quem nela confia, seja em sentimentos ou em dinheiro. Já estive pessoalmente em algumas, portanto nem estou a falar de cor – e até nem gosto de me lembrar de algumas dessas vezes, sobretudo pela forma como resolvi o problema, ou seja, despejando-lhe mais dinheiro em cima, uma situação que até me irrita confessar. Estou a falar de problemas de qualidade, raramente reconhecidos pela marca, em que a Apple lava daí as mãos, como o outro senhor bíblico.
Nos EUA, estas polémicas resultam normalmente em class actions de milhões de dólares, seja em problemas de qualidade de teclados, de placas gráficas que se suicidam sem sofrerem qualquer bullying ou em telefones que não se portam como deveriam do ponto de vista de construção. Muito raramente a Apple reconhece algo sem ser depois de se ouvir uma virtual martelada de um juiz, mas há uma primeira vez para tudo… Conto resumidamente: fruto do actual estado politicamente correcto do nosso Mundo, a Apple sofreu (e ainda sofre) críticas violentas por usar cabedal em alguns produtos. A força consumidora agitou-se contra o uso de um subproduto animal na linha de produtos vendidos pela Apple: em capas de telefone e em tiras de pele usadas nos porta-chaves AirTag.
Depois de anos de reclamações, de acções legais de organizações de ecologistas, às quais fez ouvidos moucos (e sabe o Grande Arquitecto como eu os compreendo, nesta situação), decidiu reagir, não eliminando as capas e porta-chaves (que, pelo preço e peso que têm no mercado, serão margens apetecíveis), mas “criando” um novo produto que até teve honras de apresentação numa keynote há alguns meses. Foi assim que o mundo conheceu a FineWoven, uma capa feita com materiais supostamente “eco amigáveis”. Ora, semanas depois de começarem a ser distribuídas, as capas tiveram uma recepção pública tão má, dada a sua falta de qualidade, que a Apple as fez desaparecer das suas lojas, físicas e virtuais. Isto é raro, muito raro, tão pouco frequente que é de assinalar publicamente. O gestor de produto desta linha pode estar, neste momento, a chicotear-se. Desde que seja com um chicote que não seja de cabedal, obviamente.