Há um pequeno ritual que repito há várias passagens de ano: escrevo, num papel, uma lista de coisas que quero deixar de fazer e, à meia-noite, pego-lhe fogo. As resoluções que se seguem não são para queimar, mas para que a nossa vida tenha mais luz que o piscar de ecrãs em scrolls infinitos. Cá vai.
Este é o ano para olhar menos para ecrãs, de deixar de rir e reagir ao que não acontece no meu momento e no meu espaço. É o ano de dar mais atenção a janelas de casas, de carros, de comboios e à paisagem que se desenrola lá fora. De estar em esplanadas e jardins, de livros de capa dura e mole que podem ser lidos em qualquer altura, haja luz e vontade. É o ano para estar mais presente, em corpo e em mente, onde estiver.
De ser mais criador e menos consumidor. De ficar aborrecido a ver o tempo passar e deixar que me cresçam ideias na cabeça, das minhas, para apreciar em privado ou partilhar mais tarde no tempo e na presença de quem as quiser ouvir. De deixar uma impressão digital em tudo que não é artificial: nos troncos de árvores, nas pedras, na superfície fluida da água, que tão depressa a ela se molda como a esquece, em vez de as deixar em redes sociais, fóruns, canais de YouTube e caixas de comentários.
É o ano para partilhar impulsos elétricos pelo toque na pele. De dar abraços em vez de likes. De mais gargalhadas com amigos e menos memes no WhatsApp. É o ano de ir em vez de googlar, de ser em vez de posar, de pensar com o coração e não pelo algoritmo, de agir em vez de ser influenciado. É o ano de dar a mão aos outros e acabar com o sucesso dos gurus da autoajuda e dos esquemas de enriquecer rápido que só os ajudam e enriquecem a eles.
É o ano de não temer a próxima invenção que vai mudar o mundo porque, mesmo com tudo o que se inventou até hoje, os problemas e sonhos da maioria de nós são iguais há séculos. De lembrar que a tecnologia é uma ferramenta e não um fim.
É o ano de ser mais humano e menos artificial. Quem somos é o nosso ponto forte e a última coisa que nos resta.