Propus-me entrar numa discussão tecnológica de balanços de ano de tecnologia – 2023 deverá ter a mais aborrecida discussão de balanço tecnológico de que há memória. Quando nela entrei, limitei-me a perguntar se havia sequer um concorrente para o tema da inteligência artificial. Como é absolutamente evidente, não havia. Pode até existir, mas ninguém se vai lembrar disso até ao final do ano, porque a ascensão desta tecnologia tornou muito difícil a simples concepção de um concorrente à sua altura ou porque os nossos receios iniciais (e até os de médio prazo) desaparecem a cada seis meses.
Aquilo que me espantava, e me deixava pensativo no trimestre passado, já ruiu. A cada três meses, as novidades nos sistemas de IA já não são simples ameaças, passaram a ser novos paradigmas. Aquilo que hoje já faço, por exemplo na área da clonagem de voz, estará, daqui a três meses, completamente obsoleto e prestes a ser substituído por versões melhoradas que envergonharão os resultados das anteriores. O vortex deste cone evolutivo está a girar tão rapidamente, que é possível que venhamos a ter tonturas só de olhar para ele.
Se a IA está a atravessar, de forma brutal e transversal, todas as áreas tecnológicas, também está a criar momentos de verdadeiros sorrisos. Há poucas semanas vi um professor usar uma destas ferramentas para análise de texto, no sentido de tentar perceber a originalidade de um trabalho submetido. Já não é para procurar indícios de plágio, é ir mais além, é perguntar à IA se aquilo é original ou produzido artificialmente (professores de Filosofia não se atreverão a este confronto, sob pena de incomodar Schrödinger…). É como se se pedisse a um lobo que denunciasse os autores de um assalto a um galinheiro num alinhamento de raposas.
Combater o fogo com o fogo. É tão perigoso quanto fascinante. Claro está que, no meio disto, tive de escutar umas “bocas” sobre a aparente ausência da Apple deste panorama. Claro que respondi (não muito convictamente, é certo) com um ‘ainda…’. A verdade é que, do ponto de vista de hardware, a Apple está tão bem, ou mais bem, posicionada para incluir sistemas de IA nos seus equipamentos como os demais construtores. Como controla a engenharia da produção e desempenho dos seus componentes principais, parece simples que venha a integrar sistemas de IA no sistema operativo ou em partes importantes dele (Hey, Siri!). Mas ainda não vislumbrámos muito. Ainda…