Prometo que é a última vez que falo de inteligência artificial (IA). Este ano, pelo menos. Mas, nas últimas semanas, li tantos artigos a falar de novas aplicações para a IA, que não sei se não será a maior invenção desde o pão fatiado ou a maior praga de banha da cobra desde o Zuckerverso ou os NFT.
Venho falar-vos da palavra. Não do Senhor, mas da Máquina. A Máquina é capaz de pegar nas palavras todas e conceitos associados graças ao espírito GPT-3 e criar novos significados.
Se, do ponto de vista semiótico, é revolucionário, para os estudantes baldas e cronistas com prazos apertados é a salvação. A IA como ghostwriter (sendo ‘ghost’ o termo perfeito) parece ser a grande utilização prática dos geradores avançados de linguagem. Ainda por cima, os textos criados por IA não são detectáveis por ferramentas anti-plágio.
E se, em vez de trabalhos escolares, a IA criasse uma ideologia? É o plano do Partido Sintético da Dinamarca, que passou os programas políticos dos partidos com menor expressão no país pela Máquina para criar um novo que os leve ao Parlamento Europeu. Têm até um líder virtual, o pleonástico Leader Lars. É o spin político artificial, agora inteligente.
A IA é omnipotente. Se tiverem dez dólares, claro. Por esse valor, podem criar um chatbot que “ressuscita” um ente falecido e acertar contas. Falecido, porque talvez não teve acesso à IA que consegue prever ataques cardíacos através dos olhos dos utilizadores. Tem também o poder da ubiquidade: a Ricoh fez uma aplicação que gera imagens 360º e visitas guiadas virtuais, sem terem que contratar fotógrafos.
A IA parece poder fazer tudo e um par de botas. E deve fazê-las bem. Mas não é a panaceia para todos os nossos males, há demasiado hype. Fala-se de IA desde que se fala de carros voadores e onde é que eles estão? Se cumprir com metade do que promete, a nossa relação com a realidade irá mudar mais depressa do que nos conseguimos adaptar a ela.
Mas, não se preocupem. De certeza que teremos uma IA para isso.