1996 e mais além: As novas fronteiras
O microprocessador fez com que a computação entrasse na vida quotidiana, porque permitiu a criação de máquinas mais baratas e pequenas. O hardware básico apareceu nos anos 70 do século passado, nos anos 80 a indústria dos computadores começou a perceber o valor das economias de escala e nos anos 90, a quantidade de dispositivos e interfaces que facilitaram a sua utilização aumentou exponencialmente.
O novo milénio traria uma relação mais próxima entre as pessoas e computadores. Dispositivos mais portáteis e personalizáveis transformaram-se na conduta de uma sociedade que necessitava cada vez mais de estar ligada. Assim, não é de surpreender que, à medida que as opções de ligação disponíveis proliferaram, o computador passou de ferramenta de trabalho a um companheiro indispensável.
À medida que os anos 90 acabavam, estabeleceu-se uma hierarquia no mundo dos PC. Os OEM, que tinham destronado a IBM, descobriram que a sua influência estava a ser ameaçada pela Intel. Através da campanha ‘Intel Inside’, os OEM perderam grande parte da sua individualidade.
Por sua vez, a Intel, tinha sido ultrapassada pela Microsoft depois de ter desistido de melhorar a eficiência dos componentes multimédia dos seus produtos, por ter optado pela tecnologia NSP (Native Signal Processing). A Microsoft explicou aos OEM que não iria suportar NSP no Windows, tal como já tinha acontecido com o MS-DOS e com o Windows 95.
O novo milénio traria uma relação mais próxima entre as pessoas e computadores.
A tentativa que a Intel fez de entrar no campo do software, dominado pela Microsoft, de certeza que tinha sido motivada pela crescente influência que a Microsoft na indústria e pela chegada do sistema operativo Windows CE, que reduziria a dependência da Microsoft em relação aos chips x86 a favor de processadores RISC.
A iniciativa NSP da Intel mostrou apenas uma faceta da estratégia da empresa para manter o seu lugar no mercado. Uma alteração mais dramática chegou sob a forma da arquitectura P7, que passou a chamar-se Merced, em Janeiro de 1996. Tudo foi planeado em duas fases: na primeira seria produzido um processador de 64 bits para o mercado de consumo, que seria completamente retro compatível com software de 32 bits. Na segunda seria produzido um chip de 64 bits que necessitaria de software de 64 bits.
As dificuldades associadas com a produção do hardware e com a existência de um ecossistema de software que fosse viável, levaram a Intel a focar os seus esforços em competir com os processadores RISC para os mercados profissionais com o Intanium, baseado na Intel Architecture 64 bit (IA-64), em conjunto com a Hewlett-Packard. O falhanço espectacular do Itanium, que foi devido às previsões optimistas da Intel para a arquitectura VLIW, provou que empregar grande parte dos recursos de pesquisa e desenvolvimento numa má ideia transforma-a numa má ideia cara. Financeiramente, as perdas derivadas ao Itanium foram suavizadas pela decisão de trazer a arquitectura x86 para o mercado profissional com o Pentium Pro (que mais tarde mudaria de nome para Xeon), a partir dos finais de 1996.
Em contraste, a transição da AMD de segunda fonte de chips para uma empresa que desenha e fabrica os seus próprios chips foi de sucesso em sucesso. As arquitecturas K5 e K6 afastaram a empresa da dependência da Intel, integrando rapidamente a sua própria propriedade intelectual nos processadores e motherboards, na altura em que a Intel passava para a arquitectura P5 que usava o Slot 1 e motherboards com chipset 440, cuja utilização foi proibida à AMD através de um novo acordo de licenciamento.
As arquitecturas K5 e K6 afastaram a empresa da dependência da Intel, integrando rapidamente a sua própria propriedade intelectual nos processadores e motherboards
Numa fase inicial a AMD adaptou o Socket 7 existente, para o Super Socket 7, com uma cópia licenciada do chipset Apollo VP2/97 da VIA, que dava suporte AGP para o tornar mais competitivo com a oferta da Intel. A AMD lançou de seguida o seu primeiro chipset, o “Irongate” AMD 750 e uma motherboard com o novo Slot A, para iniciar a concorrência a sério com a Intel. A Intel acusou o toque, ao ponto de, inicialmente, obrigar os fabricantes de motherboards a disponibilizar menos produtos AMD, sob pena de não receberem as quantidades do chipset 440BX que necessitavam.
O K6 e depois os K6-II e K6-III aumentaram a quota de mercado da AMD em 2%, um ano após o seu lançamento. Os ganhos no mercado dos computadores de entrada de gama aumentaram com o lançamento da primeira linha própria de produtos para computadores portáteis, que era composta pelos K6-II-P e K6-III-P. No início do ano 2000 foram adicionados mais dois produtos ao portefólio de ofertas para computadores portáteis, com o lançamento dos K2-II e K2-III+, que consumiam menos energia e funcionavam a velocidades mais altas, graças a uma redução de dimensões no processo de fabrico e à nova tecnologia PowerNow, que permitia ajustar dinamicamente a velocidade de relógio do processador para complementar as instruções 3D Now!, que serviam para melhorar o desempenho em cálculos mais complexos.
A política de preços agressiva da Intel para combater a AMD seria compensada pela rápida expansão para o mercado dos servidores. Nesta altura, o que a AMD necessitava era um produto topo de gama que removesse definitivamente a empresa da sombra da sua concorrente. Esse produto foi o K7 Athlon.
Pode dizer-se que a linhagem do K7 teve origem na Digital Equipment Corporation, cuja arquitectura Alpha RISC era um produto que procurava uma empresa capaz de realizar o seu potencial. Quando a DEC desapareceu, um dos autores dos processadores Alpha 21064 e 21164, Derrick Meyer, mudou-se para a AMD para assumir o papel de chefe de design do K7. O produto final acabou por ficar a dever aos Alpha a lógica interna e o barramento de sistema EV6.
A política de preços agressiva da Intel para combater a AMD seria compensada pela rápida expansão para o mercado dos servidores.
À medida que a arquitectura K6 continuava a cumprir o seu calendário de lançamento, a apresentação do K7 no Microprocessor Forum em San Jose a 13 de Outubro de 1998 foi o alvo de todas as atenções. As velocidades de relógio, que começavam nos 500 MHz, já eclipsavam as do Pentium II mais rápido (que funcionava a 450 MHz), e prometia chegar aos 700 MHz a médio prazo, graças à transição para interligações em cobre (nesta altura a norma era a utilização de alumínio) usadas no processo de fabrico de 180 µm na nova Fab 30 da AMD em Dresden na Alemanha.
O Athlon K7 começaria a ser comercializado em Junho de 1999, com velocidades de relógio de 500, 550 e 600 MHz. Enquanto o lançamento da versão de 600 MHz do Pentium III Katmai da Intel meses antes tinha tido problemas no modelo topo de gama a 600 MHz, o lançamento do K7 ocorreu sem quaisquer falhas e aos modelos iniciais seguiram-se as prometidas versões a 650 e 700 MHz, já fabricadas na Alemanha, acompanhadas de novos detalhes acerca do novo barramento HyperTransport, desenvolvido em parte por outro ex-DEC, Jim Keller.
A chegada do Athlon corresponde ao início do que viria a ficar conhecido como “A Guerra dos Gigahertz”. Nesta altura os fabricantes começaram a preocupar-se mais com os ganhos em marketing do que com os ganhos reais. Os avanços em Outubro de 1999 do Athlon a 700 MHz precipitaram o Pentium III Coppermine a 733 MHz, ao que a AMD respondeu com o Athlon a 750 MHz em Novembro o que levou a Intel a lançar um modelo a 800 MHz em Dezembro.
O processador da AMD chegaria a 1 GHz em Janeiro de 2000, com a apresentação do computador Presario da Compaq, com um Athlon refrigerado através de um cooler de tecnologia ‘phase change’ Super G da KryoTech, na Winter Consumer Electronics Show em Las Vegas.
O passo seguinte foi o lançamento do Athlon a 850 MHz em Fevereiro e a 1000 MHz em Março, dois dias antes da Intel apresentar o seu Pentium III a 1 GHz. Para não ficar atrás, a Intel anunciou que o seu chip tinha começado a ser distribuído uma semana antes, ao que a AMD respondeu que o seu Athlon 1000 tinha começado a ser distribuído na última semana de Fevereiro, afirmação foi provada porque a Gateway começou a entregar os primeiros computadores com o chip da AMD na altura da sua apresentação.
A corrida pelas velocidades mais altas continuou durante mais dois anos, até que a vantagem que a Intel obteve com a arquitectura NetBurst fez com que a AMD começasse a confiar mais na velocidade anunciada para todos os componentes do chip, do que na velocidade dos núcleos do processador. À medida que os preços caiam, com a chegada constante de novos produtos ao mercado, os preços dos sistemas completos vendidos pelos OEM começaram a subir, principalmente os que tinham processadores a 1 GHz. Porque tanto a AMD como a Intel aumentaram as voltagens dos seus processadores para manter a estabilidade e, por isso, tornou-se necessário usar fontes de alimentação e sistemas de refrigeração mais robustos. Logo mais caros.
O passo seguinte foi o lançamento do Athlon a 850 MHz em Fevereiro e a 1000 MHz em Março, dois dias antes da Intel apresentar o seu Pentium III a 1 GHz.
O Athlon tinha uma pequena desvantagem para a concorrência em relação ao desempenho, por causa de uma memória cache, que não estava incluída no próprio chip, e que funcionava a uma velocidade menor que o processador. O chipset Irongate e a southbridge Viper também tiveram algumas dores de crescimento. A utilização de uma alternativa da VIA, o chipset KX133, com um barramento AGP 4X e suporte para memória a 133 MHz, serviu de solução de recurso enquanto a AMD reviu o Athlon para incluir uma cache de nível 2 no próprio processador, que permitiu atingir todo o potencial, sob a forma do novo processador Thunderbird.
Com a AMD a par da Intel em desempenho, foi lançada a linha de processadores Duron para concorrer com os Celeron, southbridges e processadores móveis da Intel, no mercado dos computadores portáteis, que estava em franco crescimento e cheio de computadores da Dell, Toshiba, Sony, Fujitsu e IBM com processadores Intel.
Dois anos depois do lançamento do K7, a AMD dominaria 15% do mercado dos computadores portáteis, uma décima acima da quota de mercado que tinha em computadores de secretária nesta mesma altura. As vendas da AMD flutuaram muito entre 2000 e 2004 porque as entregas estavam muito dependentes do fabrico em Dresden.
A gerência da AMD não estava preparada para o sucesso que os seus processadores tiveram, o que resultou em rupturas de stock, que limitaram muito o crescimento da marca e da quota de mercado, numa altura em que a AMD já estava a causar muita ansiedade nas hostes da Intel. Estes problemas de stock também iriam ter impacto nos seus parceiros, em especial na HP, o que deu alguma força à Dell, um dos principais fabricantes OEM que utilizavam produtos Intel, que vendia computadores exclusivamente Intel a uma velocidade alucinante com grandes lucros, desde meados de 2003, quando o AMD K8 Opteron “SledgeHammer” foi lançado. Este era um produto que tinha sido pensado para ameaçar directamente o lucrativo mercado dos servidores com processadores Xeon.
A gerência da AMD não estava preparada para o sucesso que os seus processadores tiveram, o que resultou em rupturas de stock, que limitaram muito o crescimento da marca e da quota de mercado
Parte do falhanço em capitalizar nas arquitecturas K7 e K8 foi devido à forma de pensar do CEO da AMD, Jerry Sanders. Tal como os seus contemporâneos na Intel, Sanders era muito tradicionalista, fruto de uma época em que as empresas desenhavam, fabricavam e vendiam os seus próprios chips. O nascimento das empresas de desenho de chips sem fábrica causou-lhe algum desdém que levou à exclamação “homens a sério têm fábricas” dirigida à recém-criada Cyrix.
Esta posição mudou depois de Sanders ter saído do cargo de CEO para ser substituído por Hector Ruiz, que celebrou um contrato de fornecimento com a Chartered Semiconductor em Novembro de 2004, que começou a produção em Junho de 2006, dois meses depois da fábrica de Dresden ter começado a entregar processadores. O modelo antigo em que as empresas desenhavam e fabricavam os seus próprios chips estava a morrer, com os custos associados às fábricas de chips a subirem muito e também com surgimento de muitas empresas mais pequenas que licenciavam os designs de chips para dispositivos móveis da ARM e depois contratavam a sua produção a terceiros.
Assim como a Intel tinha desejado dominar o mercado dos servidores, que tinha margens de lucro muito superiores, a AMD também olhava para esse sector como uma forma possível de se expandir para um segmento de mercado onde a sua presença era praticamente inexistente. Enquanto que a estratégia da Intel foi de separar os produtos x86 tradicionais dos produtos para servidores e, nestes últimos, usar uma arquitectura diferente sem concorrência baseada exclusivamente na sua propriedade intelectual, a resposta da AMD foi mais convencional.
Ambas as empresas viam os computadores de 64 bits como sendo o futuro: a Intel porque tinha percebido que havia uma forte possibilidade das arquitecturas RISC poderem ultrapassar os seus produtos x86 de arquitectura CISC e a AMD porque a Intel tinha influência suficiente para se certificar que os computadores de 64 bits se tornariam o standard futuro.
Assim como a Intel tinha desejado dominar o mercado dos servidores, que tinha margens de lucro muito superiores, a AMD também olhava para esse sector como uma forma possível de se expandir para um segmento de mercado onde a sua presença era praticamente inexistente.
Completada a transição da arquitectura x86 dos 16 para 32 bits, o passo seguinte seria acrescentar funcionalidades de 64 bits com retro compatibilidade com grande parte do software disponível, para assegurar uma nova transição sem destruir o ecossistema existente. Esta foi quase sempre o plano B da Intel em vez de ser o plano A.
Por querer manter-se na liderança, no que respeita ao desenho de processadores em várias frentes, a Intel foi tentada a afastar-se a barafunda de licenças e de posse de propriedade intelectual que estava instalada há muito tempo no panorama da arquitectura x86, mesmo que isso significasse que os produtos da Intel fossem contra a aceitação da IA64. Enquanto isto, a AMD não tinha problemas desses.
Depois de ter sido tomada a decisão de incorporar uma extensão de 64 bits na estrutura x86, em vez de trabalhar a partir de uma arquitectura da DEC (Alpha), Sun (Sparc) ou Motorola/IBM (PowerPC), que restou foi criar parcerias de software para tornar realidade o conjunto de instruções, isto porque a AMD não dispunha de recursos de desenvolvimento comparáveis aos da Intel. Este facto iria jogar a favor da AMD, porque esta colaboração inicial forjou relações fortes entre a AMD e as empresas de desenvolvimento de software, o que iria ajudar na aceitação por parte da indústria de o que viria a ser a arquitectura AMD64.
A trabalhar com Fred Weber, o gestor de projecto do K8, e com Jim Keller, estariam David Cutler e Robert Short na Microsoft, que, em conjunto com Dirk Meyer (o vice-presidente da AMD para o Computation Products Group) tinham fortes de relações de trabalho que vinham do tempo em que estiveram na DEC. A AMD também se aconselharia com grupos ligados a software de código aberto, incluindo a SUSE, que viria a fornecer o compilador. Este esforço colaborativo permitiu um desenvolvimento rápido e a publicação da arquitectura AMD64, o que obrigou a Intel a arranjar uma solução concorrente.
Por querer manter-se na liderança, no que respeita ao desenho de processadores em várias frentes, a Intel foi tentada a afastar-se a barafunda de licenças e de posse de propriedade intelectual que estava instalada há muito tempo no panorama da arquitectura x86
Seis meses depois da apresentação da nova arquitectura K8, feita por Fred Weber no Microprocessor Forum em Novembro de 1999, a Intel começou a trabalhar na arquitectura Yamhill, que mais tarde mudou de nome para Clackamas, depois EM64T e finalmente Intel64. Com a AMD à frente, a Intel necessitava que a sua EM64T fosse compatível com a AMD64, que lhe valeu reconhecimento na comunidade de programadores, e mais importante: na Microsoft.
A chegada do processador para servidores Opteron, baseado no Athlon 64, em Julho de 2003, bem como da versão para computadores de secretária e portáteis em Outubro, marcaram um período de crescimento consistente para a AMD. Em 2006, a quota de mercado da AMD em servidores, que antes não existia, subiu para 22,9% às custas da Intel, o que fez com que a Intel começasse a cortar os preços dos seus produtos comparáveis. Os ganhos no mercado de consumo também foram bons, com a quota de mercado a subir de 15,8 para uns recordes 25,3%, no primeiro trimestre de 2006.
Depois desta era dourada, a AMD viria a sofrer vários reveses, dos quais ainda está a recuperar actualmente. Depois de ter sido desprezada pela Dell durante anos, em 2006 as duas empresas chegaram a acordo para trabalharem em conjunto, com a Dell a receber tratamento preferencial em relação a outros OEM. Nessa altura, a Dell era a maior fabricante de computadores em todo o mundo, vendendo 31,4 milhões de sistemas em 2004 e quase 40 milhões em 2006, mas estava numa guerra sem quartel com a HP pelo domínio do mercado.
A Dell estava a perder a guerra por várias razões: uma grande campanha de marketing montada pela HP, porque estava a perder dinheiro por cada computador que vendia, pela queda das vendas no mercado profissional (que tinha margens de lucro mais altas), devido à fraca gestão, aos problemas com entidades reguladoras e o recall de quatro milhões de baterias para computadores portáteis defeituosas. Na altura em que a empresa conseguiu voltar a equilibrar-se, tinha de concorrer com o novo líder de mercado, a HP, mas também com um crescente número de OEM que estavam a capitalizar com a popularidade dos computadores netbooks e ultraportáteis.
Nessa altura, a Dell era a maior fabricante de computadores em todo o mundo, vendendo 31,4 milhões de sistemas em 2004 e quase 40 milhões em 2006, mas estava numa guerra sem quartel com a HP pelo domínio do mercado.
2006 seria o ano do renascimento da concorrência vinda da Intel, renascimento esse que iria atirar a AMD outra vez para a periferia do mercado. No Developer Forum da Intel, que se realizou em Agosto de 2005, o CEO Paul Otellini admitiu publicamente os problemas de consumo de energia e aquecimento da arquitectura NetBurst do Pentium D, que a Intel vendia na altura. Assim que a Intel percebeu que a NetBurst necessitava de cada vez mais de energia à medida que a velocidade de relógio aumentava, desistiu de desenvolver os seu novos SoC (System on a Chip) Timna, para começar a desenvolver um novo processador de baixo consumo baseado na arquitectura P6 do Pentium Pro.
Os Centrino e Pentium M foram os antecessores da arquitectura Core e de uma linhagem que originou os processadores actuais da Intel. A AMD continuou a afinar o K8, enquanto a arquitectura 10h limitou a falta de evolução com um grande corte no preço para manter a quota de mercado até que o plano de integrar um processador gráfico no processador geral desse fruto.
Com uma grande dívida resultante da compra da Ati em 2006, a AMD estava não só perante a recuperação do lugar cimeiro por parte da concorrência, como também perante um mercado que estava a mudar rapidamente para a computação móvel, em que a Intel tinha vantagem, por ter uma oferta mais adequada à utilização em computadores portáteis. A decisão de lutar pelo lugar no mercado dos servidores fez com que a AMD começasse a desenhar processadores com vários núcleos de alta velocidade para o mercado dos topos de gama e reutilizá-los em conjunto com a propriedade intelectual que tinha adquirido à Ati.
O programa ‘Fusion’ foi anunciado no dia em que a AMD concluiu a aquisição da Ati em Novembro de 2006. Os detalhes da arquitectura e dos Bulldozer foram mostrados em Julho de 2007 com roadmaps para ambos a serem lançados em 2009.
A realidade económica do pagamento da dívida e as fracas vendas fizeram com que a quota de mercado da AMD baixasse para valores da era Athlon 64 e fez com que a empresa adiasse os planos de lançamento de novos processadores até 2011. Ao mesmo tempo, a AMD optou por não desenvolver um processador para smartphones, vendendo a propriedade intelectual que tinha neste campo à Qualcomm, o que deu origem aos GPU Adreno, que estão presentes nos SoC Snapdragon, baseados em processadores ARM.
Tanto a Intel como a AMD olharam para a integração de para gráficos nos processadores como uma parte essencial da estratégia de desenvolvimento, porque era uma forma natural de reduzir cada vez mais o número de circuitos integrados individuais necessários para fazer funcionar um computador. O anúncio da arquitectura Fusion da AMD foi seguido meses depois pelo anúncio da Intel que iria integrar hardware para gráficos nos processadores com arquitectura Nehalem. Para a Intel, a integração de processadores gráficos nos chips dos processadores gerais mostrou ser algo complicada para a equipa de desenvolvimento, por isso os chips Clarkdale, baseados na arquitectura Westmere, lançados em Janeiro de 2010 teriam um processador gráfico integrado no componente, mas não no próprio processador.
Os Centrino e Pentium M foram os antecessores da arquitectura Core e de uma linhagem que originou os processadores actuais da Intel.
No final, ambas as empresas apresentariam os seus designs de componentes com processador gráfico integrado em Janeiro de 2011, com dias de diferença. A AMD foi a primeira com o SoC Brazos, seguida da Intel, com a arquitectura Sandy Bridge. Nos anos seguintes, a Intel incluiu incrementos de desempenho a cada lançamento e conseguiu retirar o máximo de lucros possível a cada geração.
No campo da AMD, a empresa lançou finalmente a arquitectura Bulldozer em Setembro de 2011, um lançamento que foi tão atrasado que não conseguiu competir com os produtos comparáveis da concorrência, graças aos avanços de produção e à combinação de encolhimento do tamanho do processador a cada nova arquitectura (Tick-Tock) da Intel. A arma principal da AMD continuou a ser uma política de preços agressiva, o que conseguiu contrariar um pouco a estratégia da Intel de manter a sua marca como a escolha natural para os OEM e para quem quiser comprar um computador. Isto permitiu à AMD manter uma quota de mercado de 15 a 19% de ano para ano.
Os microprocessadores conquistaram o mercado não porque fossem superiores aos mainframes ou aos minicomputadores, mas devido ao facto de serem suficientes para os trabalhos mais simples que lhes eram pedidos e ao mesmo tempo sendo mais pequenos, mais baratos e mais versáteis. Esta foi exactamente a mesma dinâmica que aconteceu com a chegada de uma tecnologia concorrente que desafiou a arquitectura x86 pela hegemonia no mercado da computação de baixo custo à medida que novas classes de produtos foram sendo desenhados e lançados.
Os processadores ARM têm sido instrumentais no avanço da computação pessoal para o próximo passo da sua evolução, e mesmo tendo surgido há mais de 30 anos foram necessários avanços tecnológicos em desenho de componentes e de conectividade, para além da sua própria evolução, para lhe dar a ubiquidade que tem hoje.
A arma principal da AMD continuou a ser uma política de preços agressiva,.
Os processadores ARM foram criados pela necessidade de construir um coprocessador barato para o Acorn Business Computer (ABC), que estava a ser desenvolvido para concorrer com os PC/AT da IBM, Apple II e com HP-150 da Hewlett-Packard, que nessa altura eram as estrelas do mercado profissional.
Como não existia nenhum chip que cumprisse os requisitos, a Acorn teve de desenhar a sua própria arquitectura RISC. O trabalho foi dado a Sophie Wilson e Steve Fulber, que já tinham desenhado o protótipo que mais tarde se viria a transformar no computador BBC Micro.
Ao ARM1 seguiu-se o ARM2 que viria a ser o coração do computador Archimedes da Acorn e que chamou a atenção da Apple, que o chegou a usar no seu primeiro PDA, o Newton. O calendário de desenvolvimento do chip iria coincidir com uma quebra na procura de computadores pessoais em 1984, o que causou problemas financeiros à Acorn.
Perante as muitas dívidas por não conseguir vender os seus produtos, a Acorn criou uma empresa dedicada apenas ao desenho de CPU chamada ARM, Advanced RISC Machines. A Olivetti, o principal accionista da Acorn, e a Apple ficaram cada uma com 43% da nova empresa em troca da propriedade intelectual da Acorn, da equipa de desenvolvimento e dos fundos investidos pela Apple. A acções que sobraram seriam entregues ao parceiro encarregue pelo fabrico, a VLSI Technologies e ao co-fundador da Acorn, Hermann Hauser.
Ao primeiro processador, o ARM 600 seguiu-se logo o ARM 610, que substituiu o processador Hobbit da AT&T no PDA Newton da Apple. Apesar do Newton e o seu “irmão”, fabricado e vendido pela Sharp sob o nome Sharp Expert Pad PI-7000, terem chegado às 50000 unidades vendidas nas primeiras 10 semanas de comercialização após o lançamento, a 3 de Agosto de 1994, o preço (499 dólares) e um bug no sistema de gestão de memória que afectava a funcionalidade de reconhecimento de escrita, fez com que as vendas abrandassem ao ponto de vir a custar 100 milhões de dólares à Apple, incluindo os custos de desenvolvimento.
Perante as muitas dívidas por não conseguir vender os seus produtos, a Acorn criou uma empresa dedicada apenas ao desenho de CPU chamada ARM, Advanced RISC Machines.
O Newton, que sob o ponto de vista conceptual fazia todo o sentido, teve alguns imitadores. A AT&T que tinha fornecido o processador original desta máquina, tinha uma visão de futuro em que o Newton podia incluir mensagens de voz e sentiu-se tentada a comprar a Apple à medida que o lançamento do Newton se aproximava. No final seria o Simon Personal Communicator da IBM que daria o tiro de partida da revolução dos smartphones.
Apesar do Newton não ter sido um grande sucesso, a sua entrada no campo da computação pessoal elevou muito o estatuto da arquitectura de processadores da ARM. O lançamento do ARM7, seguido da variante Thumb ISA ATM7TDMI iria fazer com que a Texas Instruments celebrasse um contrato de licenciamento em 1993. Em 1994 seria a vez da Samsung, a DEC em 1995 e a NEC no ano seguinte. A arquitectura ARMv4T seria instrumental para os negócios com a Nokia, para ser utilizado no 6110, com a Nintendo, para ser utilizado na consola DS e Game Boy Advance e a Apple para utilização no iPod.
As vendas explodiram com a evolução da Internet móvel e às máquinas cada vez mais poderosas com um número infindável de aplicações. Esta expansão rápida levou a uma certa convergência à medida que as arquitecturas da ARM ficavam mais complexas e os processadores x86 foram optimizados e começaram a chegar a segmentos de mercado low cost, de baixo consumo energético, que antes estavam reservados a processadores ARM.
A Intel e a AMD acabaram por se aliar com as arquitecturas ARM, para apostar em todas as arquitecturas, com a segunda a desenvolver a sua arquitectura K12 de 64 bits e a primeira a entrar numa relação muito próxima com a Rockship para vender a iniciativa SoFIA da Intel composta pelos SoC Atom Silvermont e para fabricar chips com arquitectura ARM.
Ambas as estratégias da Intel têm como objectivo não deixar que a empresa não caia no mesmo erro das outras empresas de semicondutores que fabricavam os seus próprios chips, assegurando altos níveis de produção para que as fábricas continuem a operar eficientemente. As fábricas da Intel são muito grandes e muito caras e, por isso, necessitam continuamente de um grande volume de produção para se manterem viáveis.
No final seria o Simon Personal Communicator da IBM que daria o tiro de partida da revolução dos smartphones.
Os maiores obstáculos com que se depararam os principais players do mercado da computação pessoal, nomeadamente a Microsoft e a Intel, e em menor grau a Apple e a AMD, são a grande velocidade de chegada ao mercado de novos produtos permitida pelo modelo de negócio baseado em licenciamento de propriedade intelectual e a quantidade (e qualidade) de aplicações disponíveis.
O ecossistema fechado de hardware e software da Apple foram uma barreira à penetração de mercado, com a empresa a focar-se na estratégia da marca e a precisar que os mesmos clientes voltem a comprar os novos produtos que lança. Isto funciona em mercados mais maduros, mas tem um sucesso limitado em mercados emergentes onde a MediaTek, Huawei, Allwinner, Rockship, entre outras empresas, conseguem lucrar com tablets e smartphones baratos com chips ARM e sistema operativo Android.
A presença do Android é tão grande no mercado dos smartphones que mesmo a Microsoft ganha muito dinheiro com ele, só no pagamento de licenciamentos e desinveste da Nokia, olhando com interesse para o sistema operativo móvel Cyanogen, que é o preferido dos utilizadores que querem usar Android sem ter a Google a olhar-lhe por cima do ombro.
A Amazon e a Samsung seguem os passos da Microsoft e fazem ofertas de parceria ou mesmo de compra da Cyanogen. Neste momento de crescimento exponencial do mercado de dispositivos móveis, a Microsoft está perante um dilema em que o seu produto principal, o Windows, está a ser utilizado predominantemente em computadores numa altura em que os utilizadores procuram interfaces de utilização em que possam usar os dedos em cima do ecrã.
A presença do Android é tão grande no mercado dos smartphones, que mesmo a Microsoft ganha muito dinheiro com ele, só no pagamento de licenciamentos.
Pela primeira vez, a Microsoft vê-se em segundo lugar nas escolhas de software dos utilizadores. Para além da concorrência feroz do Android, a Microsoft não conseguiu aprender com a má experiencia da HP com o HP-150, que tinha um ecrã sensível ao toque 30 anos antes, que provou que a produtividade é afectada quando o utilizador alterna entre a utilização de um rato e teclado para os toques num ecrã, já para não falar da relutância que muitos utilizadores têm em usar uma tecnologia diferente. Isto fez com que muitos utilizadores de computadores pessoais a resistir à visão que a Microsoft tinha de um sistema operativo unificado.
O tempo dirá como estas relações vão funcionar, se os players tradicionais conseguem triunfar, falhar ou juntar-se. O que parece certo é que a computação, que antes tinha muitas subdivisões e mercados, se está cada vez mais a fundir num único, com novos sistemas que permitem unificar vários tipos de máquinas e tecnologias que permitem não só melhorar a ligação entre utilizadores, entre utilizadores e as máquinas e mesmo entre máquinas.
A isto chama-se ‘Internet of Things’ e vai depender muito de padrões unificados e comuns para funcionar.
Esta série de artigos passa em revista a evolução do hardware e do software ao longo de 40 anos, desde os primeiros entusiastas que montavam os componentes numa placa, se queriam que os seus computadores funcionassem, até onde estamos hoje. Num mundo em que uma criança consegue obter a informação que quiser com um toque no ecrã.
Esta é a quinta e última parte.
Se quiser pode ler as anteriores aqui:
Breve história do microprocessador e do computador pessoal parte 1: o primeiro processador comercial
Breve história do microprocessador e do computador pessoal parte 3: O ataque dos clones
Breve história do microprocessador e do computador pessoal. Parte 4: Wintel, o casamento do século