Na semana passada, a Comissão de Assuntos Jurídicos do Parlamento Europeu (JURI) votou a favor da directiva do copyright e agora, durante o próximo mês, os eurodeputados têm a oportunidade de se opor à directiva. Mas será necessário que sejam pelo menos 76 parlamentares a pôr em causa a decisão do JURI para que exista uma próxima fase de negociação. Em seguida, se tal acontecer, a mesma terá de ser discutida em várias fases até chegar à votação final no PE, o que deverá acontecer em Dezembro de 2018 ou Janeiro de 2019.
Este nova lei é polémica mas a verdade é que a área do copyright necessita de nova legislação conforme nos foi indicado pelo Dr. Manuel Lopes Rocha, sócio coordenador da equipa de propriedade intelectual da PLMJ Advogados. Segundo o especialista existe «uma lei, a directiva comércio electrónico, com dezoito anos, que data do tempo em que não existiam, praticamente, os grandes protagonistas como a Google, o Youtube, Facebook, Spotify, e cujo modelo de ausência de responsabilidade dos intermediários está, pela evolução vertiginosa da Net, em crise».
«Esta directiva copyright, que agora se discute, vem na linha de vários fenómenos convergentes: a tal ultrapassagem do sistema da directiva comércio electrónico, quanto à responsabilidade dos intermediários na Net, mesmo nos tribunais, a ampliação da noção de comunicação ao público operada pela jurisprudência do Tribunal de Justiça Europeu e a insistência contínua da Comissão da UE na aprovação de mecanismos de controlo e combate aos conteúdos ilícitos na Net. No fundo, os titulares de direitos de autor, ou as suas entidades representativas, gostariam, por exemplo, que o modelo Spotify, a tecnologia que salvou os direitos de autor da música na Net, diga-se, seja estendido ao Youtube e este é que é um dos grandes pólos em toda esta discussão», refere o advogado.
O que vai mudar
É preciso percebermos que há ainda muito que é preciso fazer pois a directiva é bastante vaga e os artigos têm diferentes interpretações. Para o responsável da PLMJ Advogados, a forma como usamos a internet não vai mudar «nada» ou vai mudar «muito pouco». Mas isto é para os utilizadores pois o caso muda de figura quando falamos dos meios que disponibilizam conteúdos na Internet. Manuel Lopes Rocha afirma que a nova Lei, caso seja de facto aprovada, «mudará as obrigações que incumbirão sobre os intermediários na Net que tiverem um papel activo na disponibilização de conteúdos na Net. Hoje quase tudo significa comunicação ao público, um conceito que se vem alargando muito e é esse alargamento que nos trouxe até aqui. E é aqui que entra a problemática dos filtros, pois a directiva não nos diz como é que os tais intermediários deverão proceder para cumprir tais comandos da lei».
É precisamente o artigo 13 que está a suscitar mais polémica pois os principais críticos da directiva indicam que vai instituir uma espécie de censura na internet, uma vez que os ” filtros de upload” vão verificar tudo o que é enviado para a Internet para ver se existem violações de direitos de autor. O especialista de propriedade intelectual afirma que «de facto, não é fácil antever como é que, na prática, este artigo vai ser utilizado. Uma utilização automática de formas de reconhecimento pode levar às consequências, já vistas no Facebook, de eliminação do célebre quadro de Courbet. Tem de haver um sistema de equilíbrio», refere.
Outra situação em discussão é o chamado imposto sobre o link patente no artigo 11 da directiva. Na opinião do advogado esta é «uma norma que vem de encontro aos interesses dos grupos de comunicação social» e fará com que os jornalistas recebam «uma parte dos montantes pagos às empresas de comunicação social pelas utilizações de conteúdos» mas será que isto vai mesmo ser assim? Ora pelo exemplo do que aconteceu em Espanha, os gigantes como a Google preferem deixar de prestar o serviço a pagarem pelos conteúdos, o que poderá afinal não ser assim tão benéficos sobretudo para os meios de comunicação social mais pequenos. No entanto, o sócio coordenador da PLMJ Advogados alerta que «a directiva parece deixar de fora a utilização privada e o uso não comercial das publicações de Imprensa ou, mesmo, as pratica de hyperlinking». Assim, alguns dos alarmes que têm soado na Internet sobre esta situação poderão estar a ser exagerados.
Em relação aos críticos à Lei, o advogado é peremptório em dizer que «este tipo de clamor público não é uma novidade para quem acompanha a actualidade da União Europeia nesta área. Já foi assim aquando da discussão das directivas de protecção autoral do software ou da impropriamente designada directiva de patentes de software». Mas há diversas opiniões, o presidente da CISAC, Jean-Michel Jarre, disse que: «arriscamos-nos a viver num mundo orwelliano em que só veremos e ouviremos o que os intermediários na Net nos quiserem dar. Depois, há aqueles que estão sempre disponíveis para falar e gritar sobre o que não sabem».
Manuel Lopes Rocha exemplificou esta situação com a sua experiência: «Há alguns anos fui a Bruxelas para o que seria uma reunião com vários eurodeputados. Ninguém apareceu, salvo o grande poeta Vasco Graça Moura, muito amável e aberto a dialogar, sem apriorismos. Mas, alguns dos seus colegas que, ao tempo, diziam nada saber do tema, dois dias depois já sabiam tudo e votaram em conformidade…». Tal continua a acontecer, vejamos o exemplo do eurodeputado Marinho Pinto, que contribuiu para que a directiva fosse aprovada. O antigo bastonário da Ordem dos Advogados foi o único português a votar a favor do artigo 13.
Assim resta-nos ver o que farão os eurodeputados no próximo mês e que alterações à directiva serão apresentadas, além da solução de compromisso já proposta pela eurodeputada Julia Reda, para que a directiva se transforme numa Lei justa para todos e que proteja os direitos de autor. Se nada for feito agora será preciso convencer mais de metade dos 752 deputados do PE a votarem contra a proposta concebida por Gunther Oettinger e Axel Voss ou corremos o risco de deixar de ter uma Internet livre, o que não vai beneficiar ninguém.